Rede do improviso: moradores de Nova Iguaçu sofrem com falta d’água

Para conseguir água no bairro Santa Rita, em Nova Iguaçu, é preciso ter muita criatividade. Há anos sem o fornecimento da Cedae em algumas ruas do bairro, moradores inventaram diferentes maneiras de abastecer suas caixas d’água.

A saída para o servidor público Daniel Pessoa, de 33 anos e morador da Rua Macapá, foi construir um captador de água da chuva. É com ele que Daniel enche sua cisterna de oito mil litros.

— Quando chove, não compro água. Só as garrafas de 20 litros para beber. São duas por semana. Quando o tempo fica firme, sem chuva, pago pelo caminhão-pipa com dez mil litros d’água. Dura dois meses — explica Daniel, que reconhece o perigo da sua “invenção’’. — Sei que tem risco (captar água da chuva), mas fazer o quê? A falta d’água aqui é nossa única tristeza. Nós cumprimos com nossas obrigações e nos sentimos lesados.

Em frente à casa de Daniel, mora o aposentado Octávio Mariano Marins, de 61 anos. Ele conta que há aproximadamente quatro anos não recebe mais conta da Cedae:

— Nós temos rede, mas a água não cai há pelo menos dez anos. Nem com a bomba conseguimos puxar. Paramos até de receber conta. Muitos moradores já acionaram a Cedae. Uso água do poço artesiano, mas sai enferrujada. Para beber, compro a mineral mesmo.

Também na Rua Macapá, a pedagoga Elizabete Santos Gomes, de 56 anos, armazena água de três jeitos diferentes. A água que consome, ela busca toda semana na casa da irmã, no bairro Corumbá. São cerca de 15 galões. Para lavar roupas e louças, pega a água que o cunhado compra de caminhão-pipa. Mas ela também realiza um processo químico no seu quintal.

— A água do poço parece clara, mas, depois, fica amarelada. No futuro, as pessoas vão se preocupar se ela está trazendo doenças. Eu jogo hipoclorito nela e, depois, encho a cisterna para jogar para a caixa — explica.

Ao ser informada sobre o problema enfrentado pelos moradores do bairro Santa Rita, em Nova Iguaçu, a Cedae garantiu que enviará uma equipe ao local. Em nota, a empresa afirmou que não havia solicitação recente junto à Cedae sobre falta d’água nos endereços visitados pelo EXTRA.

De acordo com a Cedae, os “clientes adimplentes podem solicitar carro-pipa à companhia’’. A empresa disse ainda que o fornecimento será reforçado com a ampliação do Sistema Posse, que inclui a construção de novo reservatório de cinco milhões de litros d’água; assentamento de tronco distribuidor de aproximadamente 11 km de extensão; e recuperação de reservatório de um milhão de litros de água. A obra faz parte do Programa de Abastecimento de Água da Baixada Fluminense, cujas obras já estão em andamento na região.

Câmara pode ganhar Frente de Saneamento

Por O Dia

 

Rio – Depois de o jornal O DIA divulgar, na edição do último domingo (4), que o país conta com 27 milhões de mulheres sem acesso à infraestrutura sanitária, como consta no levantamento ‘O saneamento e a vida da mulher brasileira’, do Instituto Trata Brasil, o vereador Alexandre Arraes (PSDB) diz que vai propor, hoje, a criação de uma Frente Parlamentar de Saneamento na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro. Ele precisa de 17 assinaturas (um terço do total) para isso. “É algo muito importante para população desta cidade”

Para Arraes, o Termo de Reconhecimento Recíproco de Direitos e Obrigações, firmado entre a Cedae e o Município, em 2007, não beneficia o saneamento na cidade e, por isso, deveria ser revisto o quanto antes.

“É fundamental que a Prefeitura rompa o termo de delegação dos serviços de saneamento para a Cedae com prazo de concessão de 100 anos que autoriza o despejo de esgoto na rede de águas pluviais, dentre outros absurdos, e interrompa esse ciclo perverso para a cidade”, criticou o vereador tucano.

Privatização do saneamento já se mostrou inadequada em muitos países, diz relator da ONU

Segundo estudo citado pelo relator das Nações Unidas para água e saneamento, o brasileiro Leo Heller, nos últimos 15 anos houve ao menos 180 casos de reestatização do fornecimento de água e esgoto em 35 países, em cidades como Paris (França), Berlim (Alemanha), Buenos Aires (Argentina), Budapeste (Hungria), La Paz (Bolívia) e Maputo (Moçambique).

As quebras ou não renovações dos contratos ocorreram por falhas das empresas em atingir metas de universalização, além de problemas com transparência e dificuldade de monitoramento do serviço pelo setor público.

O Brasil tem 40% de sua população sem acesso adequado à água e 60% sem acesso a esgotamento sanitário. Apesar da evolução nas últimas décadas, o quadro permanece preocupante e, para solucioná-lo, são necessários mais investimentos públicos continuados, enquanto a privatização desses serviços já se mostrou inadequada em diversos países, disse o relator especial das Nações Unidas sobre o tema, o brasileiro Leo Heller.

“A empresa privada não investe o suficiente e adota política de exclusão de populações mais pobres, impondo tarifas mais altas. Além disso, não atingem as metas dos contratos”, declarou Heller, lembrando que o próprio Banco Mundial, antes defensor das privatizações no saneamento, já reconheceu que as privatizações não são uma “panaceia para todos os problemas”.

As declarações de Heller têm como base estudo de 2014 que mostrou tendência global de reestastização desses serviços. Segundo o relatório, nos últimos 15 anos houve ao menos 180 casos de remunicipalização do fornecimento de água e esgoto em 35 países, em cidades como Paris (França), Berlim (Alemanha), Buenos Aires (Argentina), Budapeste (Hungria), La Paz (Bolívia) e Maputo (Moçambique). Desse total, houve 136 casos em países de alta renda e 44 casos em países de baixa e média renda.

No mesmo período, houve um menor número de privatizações, solução adotada por Nagpur (Índia), onde a iniciativa passou por forte oposição e crítica, e Jeddah (Arábia Saudita).

O estudo, elaborado pela Unidade Internacional de Pesquisa de Serviços Públicos (PSIRU), Instituto Transnacional (TNI) e Observatório Multinacional, apontou ainda que as iniciativas de reestatização ocorreram como resposta às falsas promessas dos operadores privados e sua incapacidade de priorizar o atendimento às comunidades em detrimento do lucro, além de falta de transparência e dificuldade de monitoramento de suas atividades pelo poder público.

“Experiência direta com problemas comuns da administração privada da água — da falta de investimentos em infraestrutura, a aumentos tarifários a riscos ao meio ambiente — convenceu comunidades e autoridades de que o setor público está mais bem posicionado para fornecer serviços de qualidade a cidadãos e promover o direito humano à água”, disse o relatório das organizações.

Heller lembrou que recentemente, no Brasil, o discurso da privatização do saneamento básico voltou à tona. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou em junho que pretende ajudar o governo do estado do Rio de Janeiro a privatizar empresas, como a Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE).

“O que podemos observar é um discurso forte no sentido de privatização do sistema, como grande saída para resolver o problema”, disse. “Mas não é essa a lição de experiências de privatização em outras partes do mundo. Por trás desse discurso poderíamos ler uma tentativa de afastamento do Estado em sua obrigação de oferecer saneamento”, declarou.

Avanços nos investimentos em saneamento

De acordo com o relator da ONU, houve avanços na cobertura da população atendida no Brasil por serviços de água e esgoto especialmente a partir de 2003, acompanhados de um aumento histórico do aporte de recursos financeiros do setor.

Segundo dados do Plano Nacional de Saneamento Básico (PLABSAB), enquanto em 2003 foram desembolsados 1,07 bilhão de reais para saneamento em recursos não onerosos — que vêm do Orçamento da União —, esse número chegou a 3,99 bilhões em 2011.

“A política de saneamento precisa de mais continuidade (do que outras políticas públicas), requer um ciclo longo de investimentos. Quando há descontinuidade, isso é fatal”, disse Heller. “Essa é uma preocupação atual. É necessário saber em que medida o ajuste fiscal não comprometerá o que foi feito nos últimos anos”, completou.

O relator destacou como um dos avanços dos últimos anos a aprovação da Lei Nacional do Saneamento Básico, de 2007, que estabeleceu regras para a prestação de serviços e impôs a necessidade de regulação do sistema, o que acabou dando origem a diversas agências reguladoras estaduais.

“Houve certo avanço na cobertura da população. Mas tem havido a meu ver muita dificuldade de ver como o governo federal decide a aplicação de seus recursos”, disse. “O planejamento pode ser a solução, mas ainda está engatinhando”, salientou.

Dados do PLABSAB de 2010 apontam que 59,4% da população brasileira tem acesso adequado a abastecimento de água, 39,7% têm atendimento adequado a esgotamento sanitário e 58,6% têm acesso adequado a manejo de resíduos sólidos.

A maior parte da população atendida está na região Sudeste, enquanto Nordeste e Norte são as regiões mais afetadas por paralisações ou interrupções no abastecimento de água. A região Nordeste também registra o maior déficit no serviço de esgoto sanitário (30%).

“O Brasil ainda está distante dos países desenvolvidos. Mas está em situação similar aos latino-americanos, parte dos asiáticos, e ao norte da África”, afirmou o relator.

“Quando observamos os Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODM), o Brasil aparece bem, tendo cumprido metas para água e esgoto”, explicou. “Mas a meta era pouco ambiciosa. O país a cumpriu, mas deixou grande parte da população sem acesso. A meta não previa a universalização, mas a redução pela metade do déficit.”

Segundo Heller, o direito humano à água obedece cinco princípios: disponibilidade, acessibilidade física, aceitabilidade, acessibilidade financeira e qualidade. Ele disse acreditar que esses pontos estão sendo considerados no monitoramento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), agenda global que ocupou o lugar dos ODM.

“Tenho acompanhado discussões com OMS (Organização Mundial da Saúde) e UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), tem havido preocupação em refletir os conceitos dos direitos humanos. A declaração dos ODS fala nitidamente (desses princípios) e as metas sugerem esses conteúdos”, afirmou, completando que, diferentemente dos ODM, os ODS consideram dados desagregados, ou seja, informações regionais de acesso por classe, etnia, entre outros, não apenas médias nacionais.

Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) preveem que os países alcancem, até 2030, acesso universal e equitativo a água potável e segura para todos, assim como acesso a saneamento e higiene adequados e equitativos para todos, além de propor o fim da defecação a céu aberto, com especial atenção para as necessidades das mulheres e meninas e daqueles em situação de vulnerabilidade.

Saneamento no combate ao zika

Heller lembrou que há um forte vínculo entre sistemas de saneamento deficientes e o surto atual do vírus zika, bem como a dengue, a febre amarela e o chikungunya, sendo todos eles transmitidos por mosquitos.

O relator divulgou recentemente comunicado sobre o tema junto com outros especialistas das Nações Unidas. O grupo alertou na ocasião que 100 milhões de pessoas na América Latina não têm acesso a saneamento básico e outras 70 milhões a água encanada.

“Várias ações de saneamento têm influência grande nos criadouros dos mosquitos. Se há fornecimento intermitente de água ou falta d’água, as pessoas passam a armazenar. Quando não tem esgoto, há empoçamento de água. Quando não há coleta de lixo, há sempre criadouro preferencial do mosquito. E quando não há drenagem, a água de chuva é criadouro”, declarou.

“A ação de saneamento seria eficiente e efetiva na eliminação de criadouros. E seria uma solução permanente, já que as iniciativas de combate ao vetor têm curta duração”, lembrou. “O saneamento não só combate essa epidemia, mas também outras doenças como diarreia.”

Os relatores especiais fazem parte do Procedimentos Especiais, maior órgão de peritos independentes no sistema de direitos humanos das Nações Unidas. Os especialistas trabalham numa base voluntária; não são funcionários da ONU e não recebem um salário pelo seu trabalho. São independentes de qualquer governo ou organização e prestam serviços em sua individualidade.

 

Reestatização cresce porque empresa privada tem serviço ruim, diz instituto

Juliana Elias

Do UOL, em São Paulo

07/03/2019 04h00

 

As privatizações são uma parte importante da agenda econômica do governo Bolsonaro e também de gestões regionais, como no Rio de Janeiro e em São Paulo. 

Mas, no mundo, está havendo um movimento contrário, de reestatização de serviços de setores importantes, como energia, água e transporte. Quase 900 reestatizações foram feitas em países centrais do capitalismo, como EUA e Alemanha.

“A nossa base de dados mostra que as reestatizações são uma tendência e estão crescendo”, disse a geógrafa Lavinia Steinfort, coordenadora de projetos do TNI (Transnational Institute), centro de estudos em democracia e sustentabilidade baseado na Holanda.

O TNI mapeou serviços privatizados que foram devolvidos ao controle público em todo o mundo entre os anos de 2000 e 2017. São casos de concessões não renovadas, contratos rompidos ou empresas compradas de volta, em sua grande maioria de serviços essenciais como distribuição de água, energia, transporte público e coleta de lixo.

Nas contas da entidade, foram ao menos 835 remunicipalizações (quando os serviços são originalmente da prefeitura) e 49 nacionalizações (ligadas ao governo central), em um total de 884 processos, movidas geralmente por reclamações de preços altos e serviços ruins.

E a tendência é acelerada: mais de 80% dos casos aconteceram de 2009 em diante.

O movimento é especialmente forte na Europa, onde só Alemanha e França já desfizeram 500 concessões e privatizações do gênero. Os episódios, porém, se repetem por todo o mundo e estão espalhados por países tão diversos quanto Canadá, Índia, Estados Unidos, Argentina, Moçambique e Japão.

Todos os casos foram compilados no relatório “Reconquistando os serviços públicos”, e uma parte também pode ser acompanhada pelo “Rastreador de remunicipalizações“, mapa interativo do TNI com as reestatizações do setor de água (ambos em inglês).

Veja dois exemplos de países que reestatizaram serviços:

França – 152 reestatizações

A França foi uma espécie de estopim para os vários processos de reestatização que começaram a se espalhar pela Europa depois que Paris, em 2008, optou por não renovar a concessão dos serviços de água e esgoto da cidade.  Eles eram desde 1985 administrados por duas companhias privadas (a Suez e a Veolia) e passaram para a responsabilidade da Eau de Paris, companhia municipal criada para assumir o negócio e até hoje a responsável pelo tratamento de água da capital francesa.  Um estudo de 2013 da entidade de defesa dos consumidores UFC Que Choisir apontou que, consideradas as cidades francesas com mais de 100 mil habitantes, aquelas com as menores tarifas.

Estados Unidos – 67 reestatizações

Contratos de água e de energia são alguns dos que foram revertidos em cidades espalhadas por estados tão diversos quanto Flórida, Havaí, Minnesota, Texas, Nova York e Indiana. Uma das primeiras a fazer algo do gênero, a cidade de Atlanta cancelou em 2003 a concessão de água feita em 1999.

O contrato era previsto para durar até 2019, mas reclamações de falta de água e má qualidade o interromperam 16 anos antes. À época, a companhia argumentou que se deparou com uma rede bem mais antiga e custosa de se reparar do que o projetado no acordo.  

Na ilha havaiana Kaua, em 2002, foram os moradores que formaram uma cooperativa (a Kauai Island Utility Cooperative) e compraram a companhia de energia da cidade, que estava à venda. A gestão é feita pela cooperativa sem fins lucrativos.

Presidente do BNDES defende privatização do saneamento

14/05/2019 – 15H05 – POR AGÊNCIA BRASIL

Em entrevista no Rio de Janeiro, o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Social e Econômico (BNDES), Joaquim Levy, falou sobre outra área em que o Banco deverá atuar mais, a de saneamento. Ele lembrou que, recentemente, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o S na sigla BNDES tem que ser de mais investimentos em saneamento:

“A gente quer abrir este mercado para o setor privado para, realmente, poder levar o saneamento para todos os lugares do Brasil e não como hoje, ter mais esse deficit de 30% a 40% da população que, por exemplo, não tem esgoto. Trazer novas tecnologias, novas maneiras de fazer isso de tal maneira que tenha esgoto barato e diminua as doenças e a poluição. Para isso a gente está trabalhando. Há muitas empresas privadas com interesse em investir no saneamento, desde que as leis estejam corretas”.

Levy adiantou, que em princípio, a expectativa do banco é de desembolsos na casa de R$ 70 bilhões, mas que o valor será reavaliado em junho. O presidente do BNDES disse que tem conversado sobre saneamento com diversos governadores para avaliar como atrair o setor privado. Ele deu o exemplo do Amapá, estado onde a elaboração de um plano de saneamento, com a participação do setor privado, está avançada. As conversas também estão adiantadas em Minas Gerais e no Rio de Janeiro.

“Aqui no Rio de Janeiro, o governador tem demonstrado interesse em dar uma solução para a Cedae que, inclusive, ajuda o estado, porque vai ter gente que vai querer pagar para operar partes da Cedae, uma coisa muito bacana e transformadora para a cidade e para o estado”.

Joaquim Levy também elogiou a iniciativa do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, que tem tido uma atuação “corajosa” e “eficaz” em abrir os serviços públicos para trazer dinheiro do setor privado. “Ele [Eduardo Leite] passou um referendo muito bacana na Assembleia do Rio Grande do Sul. Acho que isso abre uma série de oportunidades e o BNDES vai estar presente, assim como em Brasília, em todos os lugares em que o pessoal quer pensar em coisas novas e trazer o setor privado em diversas formas para soluções para a população brasileira. Assim a gente vai crescer”

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